A Costa Rica, comumente conhecida como a “Suíça da América Central”, foi considerada, pela segunda vez consecutiva, o país mais feliz do planeta. Uma nação, assegura o Índice Happy Planet da Fundação Nova Economia, onde “seus habitantes vivem vidas longas e felizes usando apenas uma fração dos recursos do planeta”. Este reconhecimento é somado ao que as Nações Unidas deram ao país ao colocá-lo na 12ª posição entre aqueles com mais alegria no mundo, e na primeira entre os da América Latina.
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Giorgio Trucchi/Opera Mundi
Plantação de abacaxi na Costa Rica. País tem apoiado modelo agroindustrial baseado na expansão das monoculturas
Para a pequena nação centro-americana, que em 1948 chegou a abolir seu Exército, a imagem de um país verde, seguro e feliz tem sido um selo de garantia amplamente aproveitado e explorado internacionalmente para promover o turismo e o investimento estrangeiro. Entretanto, dentro desse pacote de presente, há muito por se descobrir e histórias para contar.
Durante as últimas décadas, a Costa Rica tem apoiado um modelo agroindustrial baseado na expansão das monoculturas em grande escala. Dos 580 hectares de terras plantadas no país, quase 61% correspondem a cultivos industriais para exportação, com destaque para o café (19,7%), o azeite de dendê (12%), a cana de açúcar (11,5%), o abacaxi (9%) e a banana (9,8%). Somente 22% desses hectares estão destinados ao cultivo de grãos básicos, de acordo com a Sepsa (Secretaria Executiva de Planejamento do Setor Agropecuário).
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Prova disso é a situação que, por exemplo, vive a população de Pococí, no Caribe costarriquenho, onde, a partir dos anos 80, a monocultura da banana foi rapidamente substituindo a produção de grãos básicos. Agora, com a proliferação também da produção de abacaxi, os habitantes desta vasta região caribenha sofrem um grave desabastecimento de alimentos e um forte aumento dos preços.
Além disso, a expansão descontrolada do plantio do abacaxi ocasionou sérios problemas ambientais. As comunidades do Estado de Limón têm denunciado repetidamente a contaminação das águas subterrâneas e as difíceis condições de trabalho, dando início a uma campanha para que se declare uma moratória ao plantio de abacaxi nacionalmente.
Expansão do abacaxi
Apesar da crescente importação de alimentos e de seu efeito sobre o aumento do déficit na balança comercial, a Costa Rica segue com o projeto de expansão de seu modelo agroexportador, com um aumento da pressão sobre o solo e os recursos naturais.
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Na última década, a produção de abacaxi chegou a um auge nunca antes visto em outras áreas, igualando-se em pouco tempo ao histórico cultivo de banana. De acordo com dados da Sepsa, a área de plantio de abacaxi quadruplicou entre 2002 e 2012, ao passar de 11 mil para 45 mil hectares.
No entanto, a Frenasapp (Frente Nacional dos Setores Afetados pela Produção de Abacaxi, por sua sigla em espanhol), assegura que a sua extensão chegaria a cerca de 60 mil hectares. No mesmo período, o valor das exportações da fruta aumentou cerca de 650%, passando de 121 milhões de dólares, em 2000, para 791 milhões, em 2012 (Procomer – Promotoria do Comércio Exterior da Costa Rica).
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Atualmente, esse setor está nas mãos de cerca de 1300 produtores – entre pequenos (1200), médios (95) e grandes (35) — e gera cerca de 27 mil empregos diretos. 35% da área de produção pertencem às grandes empresas comerciantes e às transnacionais fruteiras norte-americanas e 65% aos produtores independentes.
De acordo com Abel Chaves, ex-presidente da junta diretiva da Canapep (Câmara Nacional dos Produtores e Exportadores de Abacaxi, por sua sigla em espanhol), o setor já cresceu de norte a sul e de leste a oeste do país, e estaria chegando ao limite da área de cultivo. Por causa da grande contribuição econômica e o impacto que tem tido sobre a geração de empregos, Chaves assegura que o país vai precisar continuar expandindo esse tipo de cultivo. “Se o mercado está pedindo mais abacaxi, então vamos plantar mais abacaxi”, disse.
A Canapep sempre minimizou o impacto negativo da expansão do abacaxi sobre o meio-ambiente e sobre o ser humano. No entanto, para várias organizações sociais e sindicais, a busca por novos territórios aumentaria ainda mais a pressão sobre o recurso da terra, da água e sobre a força de trabalho, o que reforça as denúncias que nos últimos anos têm se multiplicado, tanto nacional como internacionalmente.
Contra os sindicatos
Didier Leitón Valverde é secretário geral do SITRAP (Sindicato dos Trabalhadores de Plantações Agrícolas), organização radicada no cantão (município) de Siquirres, no estado de Limón, no Atlântico costarriquenho.
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Ele se lembra muito bem de quando, em 1999, as principais multinacionais bananeiras norte-americanas – Del Monte, Dole, Chiquita – arremeteram contra as organizações sindicais. Demitiram todos os trabalhadores e voltaram a contratá-los, mas com salários reduzidos pela metade e tirando todas as garantias coletivas e os benefícios sociais.
Leitón e boa parte dos ativistas sindicais foram incluídos em uma “lista negra” e nunca mais encontraram emprego nas plantações. Foi assim que ele começou a se dedicar em tempo integral a organizar sindicalmente os trabalhadores.
Giorgio Trucchi/Opera Mundi
Leitón e boa parte dos ativistas sindicais foram incluídos em uma “lista negra” e nunca mais encontraram emprego nas plantações
“Na Costa Rica, há uma atitude antissindical institucional e a empresa privada aproveita disso. Há uma cultura, que tem sido inculcada nas novas gerações, que equipara o sindicalismo à greve, confrontação, violência, destruição da empresa e corrupção. Isso é algo muito arraigado e os empresários impuseram o modelo ‘solidário’ pró-patronal como alternativa”, explica o dirigente sindical ao Opera Mundi.
Atualmente, 92% da população economicamente ativa da Costa Rica trabalha no setor privado e a taxa de afiliação sindical não chega aos 2%, um das mais baixas da América Latina.
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Nas plantações, sobretudo na monocultura do abacaxi, é onde mais se sente a onda antissindical. “A maioria das denúncias que recebemos se refere à violação da liberdade sindical e da convenção coletiva, direitos que são protegidos pelos Convênios 87 e 98 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Ainda assim, há fortes queixas sobre as difíceis condições de trabalho, as extenuantes jornadas, o maltrato, a falta de segurança e de higiene ocupacional e a exposição a agrotóxicos”, ressalta Leitón.